Revelação durante o nascimento de uma gota
Elvis Almeida, nasceu em 1985 no Rio de janeiro, onde vive e trabalha. Em sua primeira exposição individual em uma instituição, o artista apresenta no Paço Imperial uma série de pinturas inéditas, dispostas no espaço expositivo numa sequência em que grandes pinturas são colocadas ao lado de outras diminutas, formando assim um tipo de gráfico horizontal para o olhar. Instaladas desse modo, essas obras parecem nos sugerir um ritmo ou uma ideia de música possível.
É interessante pensar a produção de Elvis Almeida no contexto atual: ele, diferente de muitos da mesma geração, que optam por uma produção afinada com meios “não tradicionais”, marca uma posição distinta, não só por eleger a pintura como seu meio expressivo, mas também por criar procedimentos pictóricos, escala cromática e imagens que o distanciam esteticamente dos seus pares, mesmos os pintores. Elvis parte de algumas estratégias, onde seu ego/senso “não tenha tanto controle sobre o gesto, a forma ou cor que usa como ponto de partida em seu ato pictórico”. Não costuma trabalhar com referências de imagens reais ou imaginárias, porém se interessa pela repetição de formas, como o círculo, a linha, ponto e listras. Através de um método pessoal, numa constante articulação entre, escalas, suportes, procedimentos, formas, gesto e cores, o artista vai produzindo em cada trabalho, imagens singulares.
Como suporte elege papéis, madeiras, lonas de diferentes formatos e dimensões, e essas escolhas exercem papel fundamental na construção final de suas obras. Diante de suas pinturas podemos pensar em não paisagens, não escritas, imagens limiares entre figura e abstração. Tudo é dinâmico; cores em constante tensão. Podemos suspeitar onde essas imagens se originam; elas guardam proximidades com o graffiti ou com a linguagem dos quadrinhos e com as imagens oriundas da mass media.
Tudo fica aparentemente claro quando conhecemos a história pessoal do artista e o ambiente onde seus trabalhos são produzidos. Entretanto, parece interessante quando nos distanciamos ou não temos conhecimento prévio do autor e de sua biografia. São imagens que geram incertezas, podem estar situadas no futuro ou no passado; há algo nelas que as fazem parecer imagens tecnológicas ou produzidas em comunidade em algum lugar distante do nosso passado.
Talvez a grandeza da obra do Elvis seja o fato de nos tornarmos insignificantes diante dela, por suas qualidades indecifráveis e impermanentes, possibilitando provocar nos espectadores o Eterno Devir, o Vir a Ser.
Efrain Almeida e Wilson Lazaro
Wilson Lazaro A repercussão da sua pintura está por todos os lados. O mundo começou a perceber a vitalidade da nossa produção atrasado. Considerando a qualidade da arte atual brasileira, tudo está por acontecer. Como você atua nesse campo, com sua pintura?
Elvis Almeida Pintando! Me esforçando numa tentativa de ser fiel em traduzir poeticamente as dúvidas que vão surgindo em meu próprio caminho, no percurso entre vida e fazer artístico, deixando em segundo plano questões como a repercussão ou visibilidade que minha pintura possa ter, ou não ter.
WL Gosto muito de sua construção nas suas obras, é uma pintura alegre que, apesar das formas geométricas, como o círculo, não traz uma resolução a priori. Você não se preocupa em fazer referência, em seus trabalhos, a nenhum artista ou correntes artísticas. Aparenta não querer se filiar a nada ou ninguém, você explode nas pinturas! Isso emociona quando olhamos seu trabalho, traz uma forte sensação de vitalidade, já que estamos vivendo momentos bem chatos na arte hoje. Acredito que sua pintura tem um apelo sensorial! Você concorda?
EA Talvez esse apelo exista, mas não tento ter controle sobre o tipo de sensações que minha pintura pode provocar, mesmo que eu tenha uma intenção enquanto eu esteja fazendo essa pintura. Me diverte a leitura de cada um, algumas pessoas já relataram sentimentos como nojo, pêsames ou solenidade ao visitarem minha exposição.
Não acredito que a arte necessariamente tenha de ser um antídoto contra o tédio ou a chatice. Também sou fã de toda a produção que a História da Arte oficial e não oficial nos conta, mas no momento tenho dado menos importância em explorar (se é que existe) uma escola ou herança da pintura. Mas meu trabalho é repleto de referências e filiações, talvez mais íntimas, mas elas existem.
WL Há um pensamento muito europeu na pintura aqui no Brasil, principalmente em SP. Como você vê a escola desses pintores novos, que estão seguindo esse modismo, já que você está criando uma pintura bem estruturada e com personalidade própria? E como você analisa o surgimento de tantos novos artistas? Daria algum conselho aos que estão começando?
EA Em suas devidas proporções, também posso ser incluído nessa crítica, pois o processo de descolonização exige tempo, depois que você se dá conta desse pensamento europeu. Não importa se você tem ou não como referência o pensamento europeu, mas sim de que maneira você usa esse pensamento europeu. Acho que toda essa obsessão por um modo de pensar europeu na arte feita aqui no Brasil tem a ver com a História da Arte oficial mostrada na escola e a dificuldade em acessar informações sobre arte de outros lugares. Durante toda a graduação na Escola de Belas Artes na UFRJ, nunca foi apresentado, em sala de aula, conteúdo (fora de um contexto pré-História) sobre a produção da Ásia, da África, da Oceania e mesmo da América Latina.
Porém, são muitos os motivos pelos quais nos mantemos indiferentes a nossa própria cultura ou a diferentes formas de expressão artísticas que não sejam a europeia – ou a que a “crítica” europeia aponta como sendo A arte importante.
Aqui no Brasil, esse encantamento pelo tipo de arte produzida nos países “desenvolvidos”, e a tentativa de emular suas características, sempre aconteceu na música, na dança ou na arquitetura. Não costumo acompanhar artistas de São Paulo ou do Rio que sigam qualquer tipo de modismo (seja ele europeu ou do leste asiático) independente do lugar que a obra desse artista ocupe.
WL Fico bem feliz em ver tanta gente extremamente jovem e plural (periférica, negra, feminista, libertária, não binária) interessada por arte e por fazer arte, é algo muito animador.
EA Estou no momento de ouvir conselhos (inclusive de quem está começando), mas “Pinte o que quiser e morra feliz”, do artista Paulo Whitaker, continua sendo o mais valioso conselho de todos.
WL Existe algum tipo de projeto ou pintura que você não fez até agora e ainda gostaria de realizar? Já que sua pintura faz sonhar… nos conte!
EA Existem muitas cascas na pintura esperando para serem quebradas, tenho pressa mas preciso tomar cuidado para não acelerar. Fora da pintura ainda existe um campo enorme para ser explorado! A diversão está apenas começando!